Friday, December 09, 2005

Comportamento

DJs: Explosão Demográfica Fashion

Por Luiz Guilherme Amaral


Foi-se o tempo em que o DJ era apenas um contratado para tocar músicas e fazer o povo dançar. Desde o surgimento dessa profissão, nunca houve um vislumbre tão grande em ser o centro das atenções em uma casa cheia de adolescentes com os hormônios vazando pelos poros e fôlego para dançar músicas produzidas por "pickups(1)", "samplers(2)","scratches(3)" e outros infinitos estrangeirismos que dão mais charme ainda a esses profissionais. Ser DJ no século XXI é representar tudo o que há de "avant garde(4)" para a geração de jovens. Eles são hoje uma referência para quem vive guiado por estilos contemporâneos, como roupas, música ou qualquer outro tipo de linguagem característica das tribos eletrônicas. São os xamãs da noite, assediados por meninas já rotuladas de "maria-pickups"(dissidentes das maria-chuteiras, da época de Garrincha e companhia) e causando frisson em públicos estrondosos nas "raves" que surgem freneticamente no mundo inteiro.

Os que obtiveram reconhecimento mundial, como Marky Mark, Patife, entre outros, têm motivos de sobra para orgulharem-se da imagem que ostentam. Marky Mark revolucionou boa parte do mundo da música eletrônica por vir de origem humilde e por fazer de cada segundo de música sua marca registrada. Desde o clássico "pump it up"(Technotronic) nos áureos anos oitenta, uma infinidade de vertentes surgiu a partir da criatividade dos "disc jockeys", ou "Dee Jays". Com o auxílio de suas ferramentas, metros e mais metros de fios e ensurdecedores decibéis, eles foram capazes de criar estilos como "house", "techno", "trance", "psy-trance"(lê-se "sai trénss") e mais uma dúzia deles, todos com os seus respectivos apreciadores e consumidores, que distinguem inúmeras diferenças entre um e outro estilo.

Geralmente são jovens fiéis aos padrões mais atuais ditados pelos formadores de opinião da moda da Inglaterra e dos Estados Unidos, haja vista a extensa lista de termos em inglês que eles utilizam. Os mais humildes fazem empréstimos dos pais para comprar o equipamento básico, cujo preço gira em torno de R$ 2.500,00. A partir da aquisição da aparelhagem, divulgam seus nomes aos quatro ventos, pois sabem que serão requisitados onde houver mais de 20 pessoas e uma tomada. Em casos mais extremos, chegam às casas noturnas rodeados de seguranças, com direito a apresentação apoteótica e cachês de até R$ 1.500,00 para se apresentarem por 2 horas no máximo. São eles os responsáveis por instigar a sede dos jovens e fazer o dinheiro deles chegar ao caixa das casas, de preferência antes que o consumidor exagere na bebida e tenha que ser levado para o hospital, deixando uma dívida a ser paga sabe-se lá quando. A cabine dos DJs é o lugar mais disputado por quem deseja sugar um pouquinho dessa popularidade e obter por alguns instantes atenção da massa mais do que a própria música que está sendo tocada. Nas cabines concentram-se outras celebridades, como atores, modelos e produtores e têm o status de "altar", pois é lá que é criada a força motriz que fará tudo acontecer naquele momento.

Existem casos e casos de DJs. Há os que sobrevivem apenas disso e os que fazem da profissão um complemento de renda. São muito comuns os casos de jovens que abandonam os estudos para se dedicarem a isso, e aí chegamos a uma questão que deve ser amplamente debatida. Um DJ não é um profissional essencial como um médico ou um advogado, portanto sabe-se que o tempo de vida dele está no fio da navalha por conta da velocidade em que a tecnologia progride. Muitos músicos são adeptos do uso de tecnologias avançadas para aumentar o leque de opções na hora de compor arranjos e criar efeitos para suas músicas, mas há um outro lado que se nega a utilizar tais tecnologias sob a alegação de que "quebraria a aura da música". Hoje já não é necessário ter um baixista ou um baterista para se gravar um CD. Programas de computador podem fazer o papel dessas pessoas com extrema facilidade, bastando que haja um engenheiro de som e um arranjador. No mesmo caso dos DJs, chegará o dia em que pequenos dispositivos, como os iPods(5) com função "random"(músicas selecionadas aleatoriamente), substituirão esses profissionais, e ainda por cima poderão executar com extrema precisão os mesmos "scratches" e idéias que resultarão em novas batidas, tudo isso com um banco de dados e um chip muito bem estruturado. Caberá ao DJ apertar o "power" desses dispositivos e observar o resultado causado com "playlists"(6) programados com meia hora de antecedência e os efeitos criados automaticamente. Com a viabilidade dessa tecnologia, qualquer pessoa poderá exercer a profissão de DJ a hora que quiser, desde um simples adolescente trancado no seu quarto até os "macacos-velhos" que já estão com os pulsos estourados de tanto segurar discos e apertar inúmeros botões.

É oportuno pensar também que essa profissão não se resume apenas ao status e ao consumismo em si. Há também a questão do prazer de botar um vinil para tocar e criar algo em cima do que está gravado, mas é impossível não temer que daqui a dez ou quinze anos, essa profissão se torne apenas mais uma marca de uma geração e que seus profissionais desfrutem dos ganhos que obtiveram, caso haja sucesso, ou do temível anonimato e da busca de uma nova profissão. Jovens que hoje têm 18 anos e pensam que a vida se resume em tocar discos para o povo dançar podem estar sujeitos a freqüentarem salas de cursinho pré-vestibular quando chegarem aos seus 28, 30 anos. É algo para se pensar.

Glossário:

(1) pickup - equipamento utilizado pelos Djs. Consiste em dois toca-discos(ou toca CDs) e um "mixer", ou seja, um painel de controle onde se faz a transição entre um disco e outro e possibilita a criação de efeitos.

(2) sampler - dispositivo no qual o DJ separa um trecho de uma música para ser trabalhado isoladamente do todo.

(3) scratch - técnica onde o disco que está sendo tocado é manipulado de forma a criar um som semelhante ao "rasgar" ou "coçar"

(4) avant-garde - parcela da "intelligentsia" responsável por introduzir no cenário cultural, artístico etc. técnicas, idéias e conceitos novos, avançados; vanguarda (fonte: dicionário Houaiss)

(5)iPod - dispositivo criado pela Apple Computing Inc. que possui a mesma função de um walkman, porém com memória para armazenar músicas em formato MP3.

(6) playlist - uma lista onde são inseridas as músicas que serão tocadas, tal como a programação de uma rádio.

1 Comments:

Anonymous Anonymous said...

Excelente, em todos os aspectos.
A construção do texto,o desencadear das idéias. Assim como vc, tudo perfeito.

Um grande beijo ao talentoso "Luís Guilherme"

8:23 PM  

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